domingo, 6 de abril de 2014

HOMOSSEXUALISMO vs DOAÇÃO SANGUÍNEA. Um duelo vencido pelo preconceito.

Desde o surgimento da aids no início da década de 80, os homossexuais foram, em nível mundial,  o grupo populacional mais atingido pela epidemia.  Associando diferentes fatores que vão desde  as características comportamentais até o estilo de vida, o risco e a vulnerabilidade dos/as homossexuais face à infecção pelo HIV/aids, foram significativamente acentuados pela falta  de informação, pelo estigma e pelo preconceito  da sociedade. Mas foram também os homossexuais os protagonistas das primeiras e urgentes respostas para o enfrentamento dessa epidemia que ultrapassava as fronteiras da saúde, revertendo e (des)construindo o imaginário social que os vinculou, equivocadamente, à culpa,  à proibição, à doença e à discriminação.

A regulamentação que enquadra a categoria de não-doadores é uma Resolução de 14 de junho de 2004 (RDC nº. 153) da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), que dita os procedimentos de hemoterapia no Brasil e segue o direcionamento internacional ditado pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Ela define que homens que tiveram relações sexuais com outros homens (HSH) nos últimos 12 meses que antecedem a triagem clínica são inaptos temporariamente para doação de sangue.

DC 153 (14/06/2004) E DA PORTARIA MS 1353 (13/06/2011)



RESOLUÇÃO-RDC Nº 153, DE 14 DE JUNHO DE 2004

B.5.2.7.2 - Situações de Risco Acrescido

d) Serão inabilitados por um ano, como doadores de sangue ou hemocomponentes, os candidatos que nos 12 meses precedentes tenham sido expostos a uma das situações abaixo:

Homens e ou mulheres que tenham feito sexo em troca de dinheiro ou de drogas, e os parceiros sexuais destas pessoas.

Pessoas que tenham feito sexo com um ou mais parceiros ocasionais ou desconhecidos, sem uso do preservativo.

Pessoas que foram vítimas de estupro.

Homens que tiveram relações sexuais com outros homens e ou as parceiras sexuais destes.

Após seis anos de atritos e conflitos, a agência Nacional de saúde - ANVISA, atualizou a resolução que proibia homossexuais de doarem sangue. Mas essa reciclagem ainda não foi empregada em todo país.

Portaria MS nº 1.353, de 13.06.2011 - DOU 1 de 14.06.2011

Art. 1º Aprovar, na forma do Anexo a esta Portaria, o Regulamento Técnico de Procedimentos Hemoterápicos.

§ 1º O Regulamento Técnico, de que trata esta Portaria, tem o objetivo de regular a atividade hemoterápica no País, de acordo com os princípios e diretrizes da Política Nacional de Sangue, Componentes e Hemoderivados, no que se refere à captação, proteção ao doador e ao receptor, coleta, processamento, estocagem, distribuição e transfusão do sangue, de seus componentes e derivados, originados do sangue humano venoso e arterial, para diagnóstico, prevenção e tratamento de doenças.

§ 2º O Regulamento Técnico deverá ser observado por todos os órgãos e entidades, públicas e privadas, que executam atividades hemoterápicas em todo o território nacional no âmbito do Sistema Nacional de Sangue, Componentes e Derivados (SINASAN).

§ 3º A doação de sangue deve ser voluntária e altruísta.

§ 4º Os serviços de hemoterapia deverão capacitar os técnicos da Hemorrede e de suas unidades vinculadas de saúde para melhoria de atenção e acolhimento aos candidatos à doação, evitando manifestação de preconceito e discriminação por orientação sexual, identidade de gênero, hábitos de vida, atividade profissional, condição socioeconômica, raça/cor e etnia.

§ 5º A orientação sexual (heterossexualidade, bissexualidade,homossexualidade) não deve ser usada como critério para seleção de doadores de sangue, por não constituir risco em si própria.


Em uma resposta ao portal Ig, a assessoria do Ministério da Saúde afirmou que a medida visa assegurar a qualidade do sangue coletado. “A portaria define os critérios para situações de risco e de saúde do doador que oferecem perigo à pessoa que receberá o sangue. Por isso, torna inapto para doação de sangue, por 12 meses, o candidato que tenha se exposto a determinadas situações. Estão nessa categoria aqueles que tenham feito sexo em troca de dinheiro ou de drogas, que tenham feito sexo com um ou mais parceiros ocasionais ou desconhecidos e homens que tiveram relações sexuais com outros homens.”

Alguns relatos de pessoas que passaram pelo constrangimento:

“Me senti rejeitado. Se eu fosse hétero, poderia ter tido relações sexuais nos últimos 12 meses e estaria sujeito a DST também”, reclama Wesley.
" Barbara conta que decidiu a partir desse acontecimento militar pela causa LGBT. “É algo tão constrangedor, tão humilhante, que passei a me informar sobre tudo. A gente cansa de ser julgada”, desabafa.
UMA REGRA QUE SE CONTRADIZ


Segundo a Presidente da Comissão da Diversidade Sexual e Combate à Homofobia da OAB SP, Adriana Galvão, existe uma necessidade de melhorar a regulamentação na própria RDC 153, a Resolução que proíbe a doação de homossexuais masculinos. “As referidas normalizações estão contraditórias entre si e acredito que a prevalência deve ser da Portaria de 2011, que permite a doação independente de orientação sexual. A resolução de 2004 é discriminatória, pois estabelece exigência somente para os HSH (sigla usada para se referir aos homossexuais masculinos) e não para homens e mulheres heterossexuais ou lésbicas. A constitucionalidade desta resolução é extremamente questionável, ao meu ver fere frontalmente a Constituição Federal, que veda discriminações”, afirma a advogada.



Tais restrições têm levado os homossexuais a mentir nos formulários, que é uma maneira de driblar a proibição. O ato é repudiado pelo Dr. Carlos Roberto Jorge, médico da Fundação Pró-Sangue. “Acho isso extremamente grave e deplorável. Seria o mesmo que um alcoólatra fazer uma cirurgia estando bêbado e mentir”, se indignou ele.

Recentemente, a falta de reciclagem dos profissionais sobre a atualização da portaria emitida pela ANVISA, o preconceito atingiu mais uma vitima. O jovem estudante de jornalismo,Leonardo Uller, na intenção de ajudar o tio, realizou o procedimento de doação sanguínea e dias após o procedimento, informalmente, descobriu que seu sangue tinha sido desprezado por conta de sua opção sexual.
Veja a polêmica na integra:

“Você não vai querer sangue ruim no seu corpo, né? Não vai querer sangue de gente promíscua?”
“Você está insinuando que eu sou promíscuo?”
“Não.”
“Você está insinuando que os gays são promíscuos?”
“Veja bem, o que eu quis dizer é que você é uma exceção, né. É difícil ver gays em relacionamentos estáveis como o que você está relatando para mim.”

Esse foi o diálogo que Leonardo Uller teve com a médica Mirianceli Mendonça (CRM 55924-SP) ao tentar doar seu sangue no Hospital 9 de Julho, em São Paulo. O estudante de jornalismo de 19 anos respondeu ao questionário do hospital antes da doação e confirmou que era homossexual, mas que mantinha um relacionamento fixo há mais de 12 meses e que sempre usou preservativo. Ainda assim, a médica afirmou que não poderia doar seu sangue porque era considerado “de risco”.

Leonardo manteve a discussão mesmo após sofrer assédio moral e conseguiu realizar a doação. Entretanto, a pior notícia veio depois: seu sangue seria descartado. Uma colega próxima do estudante conversou com os diretores do Hospital 9 de Julho, que informou: “O hospital, que tem obrigação em preservar a saúde e vida dos pacientes, nunca será condenado por se tratar de pessoas de alto risco e contágio”. “A bolsa do sangue doado é descartada”, contou em uma conversa informal via Facebook.

O jovem relatou que já doou sangue outras vezes no Hospital São Paulo, e que nessa instituição nunca perguntaram sobre a sua sexualidade. “A pergunta é apenas quantos ‘parceiros’ nos últimos 12 meses, sem especificar o sexo”, disse Leonardo. Porém, desta vez precisava ajudar a repor as doações do Hospital 9 de Julho, onde seu tio está internado.

Em um relatório enviado à instituição, o jovem questiona: “Sobram tantos doadores no Hospital 9 de Julho para jogar o meu pelo ralo?”. Ele também enviou a Portaria Nº 1353 de 13/06/2011 do Ministério da Saúde, cujo artigo 1º § 5º define: “A orientação sexual (heterossexualidade, bissexualidade, homossexualidade) não deve ser usada como critério para seleção de doadores de sangue, por não constituir risco em si própria”.

em Portal IG, Facebook

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